Chagall e os sonhos alados

Conheço muito pouco Chagall. Mesmo assim, me atrevo a escrever este post. O texto não será fruto de conhecimento ou de experiência. Mas será o que sinto e percebo, admirando suas obras. E um pouco de pesquisa na Internet, óbvio.

ChagallMarc Chagall (1887 – 1985) foi um pintor, ceramista e gravurista surrealista judeu russo-francês.  O artista viajou para Paris em 1910, tendo feito lá vários amigos poetas – Blaise Cendrars, Max Jacob e Apollinaire – e pintores – Delaunay, Modigliani e La Fresnay. Neste primeiro contato com Paris, produz obras de extrema importância, como “O soldado bebê” e “Eu e minha aldeia“.  Esta última é considerada a mais famosa obra de Marc Chagall e uma das mais famosas de todo o Mundo e de toda a história da arte, também considerada uma das primeiras obras surrealistas, embora que em 1911 ainda não existisse oficialmente o Surrealismo.

Chagall - Eu e a aldeia

“Eu e a aldeia”, 1911, ost, 192 X 151cm. Exposta no MoMA, em Nova Iorque.

 

Classificado como surrealista, Chagall passeou pelas trilhas do construtivismo, do fauvismo e do expressionismo.

Chagall - le coq et le renard

“Le coq et le renard” em “Fables”

A Primeira Guerra Mundial encontra Chagall na Rússia e, quando irrompe a Revolução de 1917, após fundar uma escola aberta a todas as tendências, entra em conflito com Kasimir Malevith, fundador do Suprematismo (clique aqui se quiser saber mais sobre este movimento).  Nesta época pintou murais para a sala e o foyer do teatro judeu de Moscou, só voltando à Paris em 1922. Por encomenda de Ambroise Vollard, executou 96 gravuras para uma edição de “Almas mortas“, de Gogol e em 1927 ilustrou as “Fábulas” de La Fontaine (um conjunto de 100 gravuras).

Sendo judeu, Chagall foi perseguido na Segunda Guerra Mundial e em 1941, partiu para os Estados Unidos. O clima de perseguição e de guerra repercutiu em sua pintura, onde surgiram elementos dramáticos, sociais e religiosos. Assim, a arte, a origem judaica e a sua trajetória de vida estão intimamente interligadas.

Chagall - A queda de um anjo

“A queda de um anjo”, 1947

Uma das obras pós-guerra mais significativas e cheia de elementos simbólicos é “A queda de um anjo“, feita em 1947.  O anjo vermelho (Terceiro Reich) está caindo, resta uma vela (resistência judaica) no menorah (símbolo judaico) e dois símbolos cristãos também aparecem: Nossa Senhora com o Menino, na asa do anjo, e o Cristo crucificado, outro símbolo de resistência.

Chagall - la mariee

“La mariée”, guache e pastel, 1950, 68 X 53cm

Chagall - Les amants au ciel rouge

“Les amants au ciel rouge”, ost, 1950, 65,1 X 66,4cm

Anjos, relógios, violinos, animais, luas e uma cor predominante, o vermelho. Chagall recorria frequentemente a estes elementos para expressar seus pensamentos, seus desejos. E por que alguns destes elementos aparecem voando em suas telas? Porque são frutos de sua imaginação, de seus sonhos. Por que um bode não pode tocar violino? Por que um casal aparece voando sobre as casas, como se fosse nuvem? Tudo pode. Tudo são manifestações oníricas de suas memórias, ou de seus desejos.

Em 1964, o famoso Opéra de Paris inaugurou o seu novo teto, pintado por Marc Chagall. Após ter assistido ao trabalho do artista em Daphnis e Chloe, Andre Malraux, ministro da Cultura francês, encomendou-lhe a pintura do novo teto do Opéra de Paris. Trabalhando em uma superfície de 560 metros quadrados, Chagall dividiu o teto em zonas coloridas que preencheu com paisagens e figuras representativas dos luminares da ópera e do balé.

Chagall - teto do Opera

Teto do Opéra de Paris

Já estive algumas vezes neste teatro monumental em Paris e nunca deixo de ir admirar esta obra onírica, que transporta qualquer pessoa dotada de um mínimo de sensibilidade a lugares que sua imaginação permitir.

É de Chagall a frase: “Haverá sempre crianças que amarão a pureza, apesar do inferno criado pelos homens”. Artista longevo e de ininterrupta produção, Chagall foi ao mesmo tempo um sonhador e um lírico, um mágico e um ingênuo, e usava sua arte para materializar o que tinha de mais nobre em sua alma: a bondade e a inocência. (*)

No âmbito da arte contemporânea, marcada pelo formalismo e a abstração, a pintura de Chagall se destaca pela importância que tem nela o elemento temático, de fundo onírico, que, por sua vez, reflete as profundas raízes afetivas e culturais do artista. Nestes tempos de tecnologia imperante, de desconforto com tudo o que possa ser ingênuo ou inocente, a obra de Chagall aparece como um oásis na arte de nossos tempos.

(*) Vale a pena ler este texto sobre Marc Chagall.

Autor: Catherine Beltrão

Comment(1)

  1. Responder
    Mario says:

    Conteúdo muito bom. Tá de parabéns.

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