Natais eternizados

De onde vem a tradição de uma árvore de Natal?

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Árvore de Natal da rainha Victoria

A tradição de usar árvores para decorar as casas é bem antiga. Os egípcios, celtas, romanos e até mesmo os vikings traziam árvores para dentro de casa. As árvores eram usadas como decoração no solstício de inverno e acreditava-se que, ao final dessa estação, o sol iria reaparecer e as plantas voltariam a crescer.

Mas foi por volta do século XVI que as árvores de natal tornaram-se um costume cristão. A tradição da árvore de Natal não se espalhou rapidamente pela Europa. Foi somente em 1846, após a publicação de uma ilustração da rainha Victória e do príncipe Albert com seus filhos em volta de uma árvore de natal cheia de presentes, que pessoas de outros países passaram a utilizá-la.

No Brasil, o costume de enfeitar árvores de Natal entre os cristãos só apareceu no começo do século XX.

E, como seria de se esperar, pintores e poetas expressaram o Natal, seja com árvores , seja com meninos em manjedouras…

Natal_ViggoJohansen

“Silent Night”,1891
Viggo Johansen (Dinamarca, 1851-1935)
óleo sobre tela

Manoel de Barros escreveu:

Meu avô hoje ganhou de presente um olhar de pássaro
Acho que ele vai usar esse olhar para fazer as suas artes
O mundo para ele anda muito cansado
Ele quer mudar o jeito das coisas do mundo
Por exemplo ele vai dar primavera aos vermes
O homem não vai mais fabricar armas de fogo
Só vai ter mesmo rio, árvores, o sol, bichos ,pedras
Ele vai desenhar a sua voz nas pedras
Os grilos vão se abrir no meio da noite com enormes lírios
Todo mundo vai gostar mesmo é de obedecer as falas das crianças
Do que as ordens gramaticais
Os sapos vão andar de bicicleta
Depois vamos assistir ao nascimento de Jesus
Será o Natal
E todos vamos adotar as boas falas do filho de Deus
Amar o próximo como a nós mesmos
Então o mundo será renovado !

Poema de Natal“, de Vinicius de Moraes

Arvore de Natal_anos50

“Arbre de Noël”, 1956
Edith Blin (França, 1891-1983)
pastel sobre cartolina

Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos…
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.”

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“Festa de Natal”, 1943
Georgina de Albuquerque (Brasil, 1885-1962)
óleo sobre tela

Canto de Natal“, de Manuel Bandeira:

“O nosso menino
Nasceu em Belém.
Nasceu tão-somente
Para querer bem.
Nasceu sobre as palhas
O nosso menino.
Mas a mãe sabia
Que ele era divino.
Vem para sofrer
A morte na cruz,
O nosso menino.
Seu nome é Jesus.
Por nós ele aceita
O humano destino:
Louvemos a glória
De Jesus menino.”

Natal_HenryMosler

“Manhã de Natal”, 1916
Henry Mosler (EUA, 1841-1920)
óleo sobre tela

O Que Fizeram do Natal“, de Carlos Drummond de Andrade

“Natal.
O sino toca fino.
Não tem neves, não tem gelos.
Natal.
Já nasceu o deus menino.
As beatas foram ver,
Encontraram o coitadinho
(Natal)
mais o boi mais o burrinho
e lá em cima
a estrelinha alumiando.
Natal.

As beatas ajoelharam
e adoraram o deus nuzinho
mas as filhas das beatas
e os namorados das filhas
foram dançar black-bottom
nos clubes sem presépio.”

Natal_AlbertChevallierTyler

“A árvore de Natal”, 1911
Albert Chevallier Tayler (GB, 1862-1925)
óleo sobre tela

História Antiga“, de Miguel Torga

“Era uma vez, lá na Judeia, um rei.
Feio bicho, de resto:
Uma cara de burro sem cabresto
E duas grandes tranças.
A gente olhava, reparava e via
Que naquela figura não havia
Olhos de quem gosta de crianças.

E, na verdade, assim acontecia.
Porque um dia,
O malvado,
Só por ter o poder de quem é rei
Por não ter coração,
Sem mais nem menos,
Mandou matar quantos eram pequenos
Nas cidades e aldeias da nação.”

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“A árvore de Natal”
Elizabeth Adela Stanhope Forbes (Canadá, 1859–1912)
óleo sobre tela

Natal…“, de Fernando Pessoa

“Natal… Na província neva.
Nos lares aconchegados,
Um sentimento conserva
Os sentimentos passados.

Coração oposto ao mundo,
Como a família é verdade!
Meu pensamento é profundo,
‘Stou só e sonho saudade.

E como é branca de graça
A paisagem que não sei,
Vista de trás da vidraça
Do lar que nunca terei!”

Na manjedoura“, de Clarice Lispector

“Na manjedoura estava calmo e bom. Era de tardinha, ainda não se via a estrela. Por enquanto o nascimento era só de família. Os outros sentiam, mas ninguém via. Na tarde já escurecida, na palha cor de ouro, tenro como um cordeiro refulgia o menino, tenro como o nosso filho. Bem de perto, uma cara de boi e outra de jumento olhavam, e esquentavam o ar com o hálito do corpo. Era depois do parto e tudo úmido repousava, tudo úmido e morno respirava. Maria descansava o corpo cansado, sua tarefa no mundo seria a de cumprir o seu destino e ela agora repousava e olhava. José, de longas barbas, meditava; seu destino, que era o de entender, se realizara. O destino da criança era o de nascer. E o dos bichos ali se fazia e refazia: o de amar sem saber que amavam. A inocência dos meninos, esta a doçura dos brutos compreendia. E, antes dos reis, presenteavam o nascido com o que possuíam: o olhar grande que eles têm e a tepidez do ventre que eles são.

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“Armando a árvore”
Elena Khmeleva (Rússia, 1966)
óleo sobre tela

A humanidade é filha de Cristo homem, mas as crianças, os brutos e os amantes são filhos daquele instante na manjedoura. Como são filhos de menino, os seus erros são iluminados: a marca do cordeiro é o seu destino. Eles se reconhecem por uma palidez na testa, como a de uma estrela de tarde, um cheiro de palha e terra, uma paciência de infante. Também as crianças, os pobres de espírito e os que amam são recusados nas hospedarias. Um menino, porém, é o seu pastor e nada lhes faltará. Há séculos eles se escondem em mistérios e estábulos onde pelos séculos repetem o instante do nascimento: a alegria dos homens.

Natal_HansStubenrauch

“Oh, árvore de Natal”
Hans Stubenrauch (Alemanha, 1875 – 1941)
óleo sobre tela

Tudo tão vago“, de Mário Quintana

Nossa senhora
Na beira do rio
Lavando os paninhos
Do bento filhinho…
São João estendia,
São José enxugava
e a criança chorava
do frio que fazia

Dorme criança
dorme meu amor
que a faca que corta
dá talho sem dor
(de uma cantiga de ninar)
Tudo tão vago…Sei que havia um rio…
Um choro aflito…Alguém cantou, no entanto…
E ao monótono embalo do acalanto
O choro pouco a pouco se extinguiu…
O menino dormira…Mas o canto
Natural como as águas prosseguiu…
E ia purificando como um rio
Meu coração que enegrecera tanto…
E era a voz que eu ouvi em pequenino…
E era Maria junto à correnteza,
Lavando as roupas de Jesus Menino…

Eras tu…que ao me ver neste abandono
Daí do céu cantavas com certeza
Para embalar inda uma vez meu sono!…

Natal_AlexeiMikhailovichKorin

“A árvore de Natal”
Alexei Mikhailovich Korin (Rússia, 1865 – 1923)
óleo sobre tela

Para muitos de nós, as árvores de Natal são pedaços de nossa infância. Que teimamos em perpetuar em nossos filhos. Lembranças de crianças para crianças. Não há necessidade de mais presentes.

Autor: Catherine Beltrão

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