Algumas obras de arte já ultrapassaram o valor de cem milhões de dólares ao trocarem de mãos em leilões da Sotheby’s/Londres e da Christie’s/NY. O que faz uma obra de arte valorizar tanto? O que encanta tanto um colecionador?
Após uma pesquisa internetiana em alguns links sobre o assunto, condensei as seguintes informações sobre as cinco obras mais caras já vendidas em leilões até hoje:
1. “Três estudos de Lucien Freud“, de Francis Bacon (1909-1962). Obra mais cara do britânico Francis Bacon ( o artista, não o filósofo, este falecido em 1626) e a mais cara já arrematada em leilões de arte até hoje. Valor: US$ 142,4 milhões, vendido na Christie’s, em novembro de 2013.
O triplo retrato do artista britânico, representando outro importante pintor do século XX, que era também seu amigo, marca a relação de Bacon e Freud, prestando homenagem ao parentesco criativo e emocional dos dois artistas. Os dois britânicos conheceram-se em 1945 numa estação de comboios, quando estavam a caminho da casa de campo de um amigo comum e tornaram-se muito próximos de imediato. Nos anos 50, encontravam-se todos os dias para trabalhar ou passear pelo Soho. Tinham em comum a pintura, apesar de métodos e abordagens bem diferentes, e o fascínio pelo jogo – Freud apostava nos cavalos e Bacon privilegiava o casino. Era raro o dia em que não jantavam juntos. Não é por isso de estranhar que se tivessem, de alguma forma, influenciado, e que desenhassem e pintassem retratos um do outro mais do que uma vez, antes de se distanciarem na década de 1970.
O tríptico foi pintado em 1969, no Royal College de Londres, depois de um incêndio ter destruído o estúdio de Bacon. Foi também nessa altura que, depois de exposto no Grand Palais (1971-72), o tríptico foi separado, voltando apenas a ser mostrado completo no Connecticut em 1999.
2. “O Grito“, de Edvard Munch (1863-1944). Valor da obra: US$ 119,9 milhões, vendida na Sotheby’s, em maio de 2012.
O Grito (no original Skrik) é uma série de quatro pinturas do norueguês Edvard Munch, a mais célebre das quais datada de 1893. A obra representa uma figura andrógina num momento de profunda angústia e desespero existencial. O plano de fundo é a doca de Oslofjord (em Oslo) ao pôr-do-Sol.
O Grito é considerado como uma das obras mais importantes do movimento expressionista e adquiriu um estatuto de ícone cultural, a par da Mona Lisa de Leonardo da Vinci. É curioso que existam várias versões diferentes deste quadro para além da obra de 1893. Em todas o carimbo emocional de Munch está presente para nos recordar que o lado negro da vida pode ser belo.
Há uma série de factores que influenciaram Munch para a realização deste quadro. Desde já, um período em que esteve doente em Nice, em 1892. Edvard escreveu em seu diário o momento que por certo o inspirou a pintar a sua obra: “Estava a passear cá fora com dois amigos, e o Sol começava a pôr-se – de repente o céu ficou vermelho, cor de sangue – Parei, sentia-me exausto e apoiei-me a uma cerca – havia sangue e língua de fogo por cima do fiorde azul-escuro e da cidade – os meus amigos continuaram a andar e eu ali fiquei, de pé, a tremer de medo – e senti um grito infindável a atravessar a Natureza “.
A versão vendida no leilão de maio na Sotheby’s era a de pastel sobre cartão, de Petter Olsen, cujo pai foi amigo e vizinho de Munch.
3. “Nu, folhas verdes e busto“, de Pablo Picasso (1881-1973). Valor da obra: US$ 106,4 milhões, vendida na Christie’s, em 2010.
A obra, com título original “Nu au plateau de sculpteur“, foi pintada em apenas um dia e representa a amante do espanhol Picasso, Marie-Thérèse Walter, nua e reclinada. O busto no pedestal é uma imagem do próprio Picasso, que assim se fez representar no quadro de perfil. É um dos quadros de uma sequência de retratos de Marie-Therese Walter, pintados por Picasso em Boisgeloup, na Normandia, nos primeiros meses de 1932. São tidos como algumas das suas obras-primas do período entre guerras.
O ano em que este quadro foi pintado é considerado um ponto de virada para o artista, pois foi a partir dai que ele começou a criar telas totalmente diferente de tudo o que já tinha feito antes: maiores e mais sensuais. A obra estava desde os anos 1950 na posse de dois colecionadores de Los Angeles, Frances e Sidney Brody, ambos falecidos e só foi mostrada em público uma vez em 1961, coincidindo com o aniversário de 80 anos o pintor.
4. “Homem Caminhando I“, de Alberto Giacometti (1901-1966). Valor da obra: US$ 104,3 milhões, vendida na Sotheby’s, em 2010.
A escultura de bronze, intitulada no original “L’Homme qui marche I”, mostra um homem solitário a meio-passo, com os braços pendurados ao seu lado. A peça é descrita como uma “humilde imagem, tanto de um homem comum, como de um poderoso símbolo da humanidade”. O suíço Giacometti descreveu a escultura, por ter visto “o equilíbrio natural do passo” como um símbolo de força “do homem na sua própria vida“.
Em 1960, Giacometti foi convidado a fazer parte de um projeto público pela Chase Manhattan Plaza, em Nova York, para fundar figuras de bronze no exterior do edifício. Ele criou várias esculturas com o L’Homme qui marche I entre eles. Giacometti teve dificuldades para desenvolver o projeto e acabou abrindo mão da encomenda. No entanto, em 1961, ele lançou o tamanho da vida de trabalho em bronze e expôs na um ano depois.
L’Homme Qui Marche I foi criado num período alto de Giacometti e representa o ápice de sua experimentação com a forma humana. A peça é considerada uma das mais importantes obras do artista e uma das imagens mais icônicas da arte moderna e está estampada também na nota de 100 francos suíços. Existem seis originais da peça.
Curiosidade: Homem caminhando I era uma das 3 mil obras da coleção de arte do Dresdner Bank e estava exposta no hall de entrada do banco em Frankfurt. Com a fusão de maio de 2008, ela passou para o Commerzbank, que, segundo o portal Tagesanzeiger.ch, se desfez da obra “porque a figura do homem emagrecido poderia ser interpretada como símbolo da crise bancária”.
5. “Rapaz com cachimbo“, de Pablo Picasso (1881-1973). Valor da obra: US$ 104,2 milhões, vendida na Sotheby’s, em 2004.
Com o título original de “Garçon à la Pipe”, Picasso pintou o famoso quadro quando dos seus 24 anos, durante o seu Período Rosa. O óleo sobre tela, pintado em Montmartre, França, retrata um jovem rapaz francês com um cachimbo na mão esquerda e uma coroa de rosas na cabeça.
Pouco se sabe sobe o menino que serviu de modelo para esta obra. Algumas fontes mencionam que ele teria cerca de dez anos de idade e que teria manifestado o desejo de posar para o pintor.
A obra deixa transparecer o estilo adotado por Picasso nos seus primeiros anos como artista e é considerada por muitos a principal tela deste período que ainda permanece sob domínio privado.
Curiosidade: a primeira compra desta obra foi feita em 1950, pelo valor de US$ 30 mil.
Voltando à pergunta inicial: O que faz uma obra de arte chegar a valer mais de cem milhões de dólares? O que encanta tanto um colecionador de arte?
Além do óbvio – investimento, status, cobiça, disputa, … – eu acredito que a história que a obra possui exerce muita influência no processo de sua valorização. Em qual contexto foi criada, como foi sua trajetória de percurso desde sua criação ou, caso a obra retrate alguém, qual teria sido a relação do artista com este(a) modelo… enfim, considerando que o artista morre, como qualquer outro indivíduo, cada uma de suas obras continua a representar pedaços de sua vida, de seus relacionamentos, de suas crenças ou pensamentos. É isto que emociona. É isto que comove. É isto que encanta.
Autor: Catherine Beltrão
Comments(4)
Michel Beltrão says:
8 de abril de 2014 at 03:50Aristóteles sacou uma diferença entre o valor de uso (subjetivo e individual) e o valor de troca (objetivo, com “preço de mercado”, logo coletivo). Mas como se chega ao valor de uma obra de arte?
A resposta passa pela tensão entre Estética e Mística. Curioso é que na antiga Astrologia a Mística se expressa no último signo, Peixes; e grana, (preço, valor de troca), pelo signo oposto, Virgem. Um tem a ver com o outro.
O caso é que na Idade Moderna a Estética tomou o lugar da Mística: tem Valor em nossa cultura o que é expressão do homem, não mais os assuntos do Alto. O preço é decorrente do que valorizamos.
Catherine Beltrão says:
25 de abril de 2014 at 18:18É. Pelo visto, a tendência, cada vez mais, e estar “tudo junto e misturado”… é mais fácil. Não é preciso conhecimento para se distinguir as coisas. Outro exemplo: o fast food . Bota mostarda e ketchup e fica tudo com o mesmo gosto.
Maria Benedicta Guimaraes says:
25 de abril de 2014 at 03:45Amei o que aprendi aqui. Tinha que ser com sua assinatura. Quero maissssssssssssssss.
Parabens!
Catherine Beltrão says:
25 de abril de 2014 at 18:11Obrigada, Bené! Adorei também fazer esta pesquisa na Internet. E incluir meu comentário na parte final. A intenção do blog é esta mesma: publicar posts sobre arte, que sirvam de pretexto para discussões entre os leitores…