Três mulheres: Edith, Katia e Cecília

Hoje, Dia Internacional da Mulher, resolvi escrever mais de um post. Este é reunindo três mulheres: a escritora Cecília Meireles, a pintora Edith Blin e a sua modelo Katia (eu).

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“Retrato de Katia com fita azul no cabelo”, 1956. Óleo sobre tela, 55 X 45cm.

“Mulher adormecida”, de Cecília Meireles

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“Retrato de Katia em verde e amarelo”, 1955. Pastel sobre cartolina, 30 X 22cm.

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“Retrato de Katia com os olhos no além”, 1957. Óleo sobre tela, 55 X 46cm.

Moro no ventre da noite:
sou a jamais nascida.
E a cada instante aguardo vida.

As estrelas, mais o negrume
são minhas faixas tutelares,
e as areias e o sal dos mares.

Ser tão completa e estar tão longe!
Sem nome e sem família cresço,
e sem rosto me reconheço.

Profunda é a noite onde moro.
Dá no que tanto se procura.
Mas intransitável, e escura.

Estarei um tempo divino
como árvore em quieta semente,
dobrada na noite, e dormente.

Até que de algum lado venha
a anunciação do meu segredo
desentranhar-me deste enredo,

Arrancar-me á vagueza imensa,
consolar-me deste abandono,
mudar-me a posição do sono.

Ah, causador dos meus olhos,
que paisagem cria ou pensa
para mim, a noite densa?

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“Retrato de Katia vestindo azul”, 1971. Pastel sobre cartolina preta, 75 X 50cm.

“Mulher ao espelho”, de Cecília Meireles

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Figura 43 – “Katia! Mon modèle!”, 1961. Desenho a carvão, 70 X 50cm.

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“Retrato de Katia com margarida no cabelo”, 1967. Desenho a carvão e pastel, 30 X 22cm

Hoje que seja esta ou aquela,
pouco me importa.
Quero apenas parecer bela,
pois, seja qual for, estou morta.

Já fui loura, já fui morena,
já fui Margarida e Beatriz.
Já fui Maria e Madalena.
Só não pude ser como quis.

Que mal faz, esta cor fingida
do meu cabelo, e do meu rosto,
se tudo é tinta: o mundo, a vida,
o contentamento, o desgosto?

Por fora, serei como queira
a moda, que me vai matando.
Que me levem pele e caveira
ao nada, não me importa quando.

Mas quem viu, tão dilacerados,
olhos, braços e sonhos seu
se morreu pelos seus pecados,
falará com Deus.

Falará, coberta de luzes,
do alto penteado ao rubro artelho.
Porque uns expiram sobre cruzes,
outros, buscando-se no espelho.

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“Retrato de Katia com mechas”, 1971. Patel sobre cartolina preta, 35 X 28cm.

“Retrato de Mulher Triste”, de Cecília Meireles

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“Retrato de Katia por inteiro”, 1968. Óleo sobre tela, 146 X 50cm.

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“Retrato de Katia com rabo-de-cavalo”, 1964. Pastel sobre cartolina preta, 50 X 38cm.

Vestiu-se para um baile que não há.
Sentou-se com suas últimas jóias.
E olha para o lado, imóvel.

Está vendo os salões que se acabaram,
embala-se em valsas que não dançou,
levemente sorri para um homem.
O homem que não existiu.

Se alguém lhe disser que sonha,
levantará com desdém o arco das sobrancelhas,
Pois jamais se viveu com tanta plenitude.

Mas para falar de sua vida
tem de abaixar as quase infantis pestanas,
e esperar que se apaguem duas infinitas lágrimas.

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“Retrato de Katia meiga”, 1976. Óleo sobre cartolina preta, 51 X 38cm.

A poesia e a pintura sempre foram amigas. Minhas amigas. Edith chegou a ser cúmplice. Cecília, confidente de meus segredos de alma. Somos as três, mulheres. Mulheres da Arte e da Literatura. Que dádiva!

Fotos das obras: Ana Cláudia Gadini.

Autor: Catherine Beltrão

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