Na última semana do ano, resolvi brindar à solidão. Talvez seja porque solidão rima com reflexão. E este é o momento em que se faz reflexões. Reflexões sobre o ano que passou. Reflexões sobre o ano que está por vir.
Para brindar, chamei Edward Hopper e Clarice Lispector. Eles souberam, mais do que qualquer outro, expressar a solidão através da pintura e da literatura.
Edward Hopper (1882-1967) artista americano, retratou com muita realidade a solidão dos Estados Unidos do início do século XX. Realista imaginativo, ele retratou com subjetividade a solidão urbana e a estagnação do homem. As figuras quase nunca se comunicam.
Clarice Lispector (1920-1977) foi uma escritora e jornalista nascida na Ucrânia e naturalizada brasileira, sendo considerada uma das escritoras brasileiras mais importantes do século XX. Sua obra está repleta de cenas cotidianas simples e tramas psicológicas, envolvendo personagens comuns em momentos do cotidiano.
“Sim, minha força está na solidão. Não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem das grandes ventanias soltas, pois eu também sou o escuro da noite.”
“Amor será dar de presente ao outro a própria solidão? Pois é a última coisa que se pode dar de si.”
“...Que minha solidão me sirva de companhia.
que eu tenha a coragem de me enfrentar. Que eu saiba ficar com o nada
e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo.”
“Não me prendo a nada que me defina. Sou companhia, mas posso ser solidão. Tranqüilidade e inconstância, pedra e coração. Sou abraços, sorrisos, ânimo, bom humor, sarcasmo, preguiça e sono. Música alta e silêncio. Serei o que você quiser, mas só quando eu quiser. Não me limito, não sou cruel comigo! Serei sempre apego pelo que vale a pena e desapego pelo que não quer valer… Suponho que me entender não é uma questão de inteligência e sim de sentir, de entrar em contato. Ou toca, ou não toca.”
“Desculpem eu ser eu. Quero ficar só! grita a alma do tímido que só se liberta na solidão. Contraditoriamente quer o quente aconchego das pessoas.”
“Eu tenho que ser minha amiga, senão não aguento a solidão. Quando estou sozinha procuro não pensar porque tenho medo de de repente pensar uma coisa nova demais para mim mesma. Falar alto sozinha e para “o quê” é dirigir-se ao mundo, é criar uma voz potente que consegue – consegue o quê?”
“E eis que sinto que em breve nos separaremos. Minha verdade espantada é que eu sempre estive só de ti e não sabia. Agora sei: sou só. Eu e minha liberdade que não sei usar. Grande responsabilidade da solidão. Quem não é perdido não conhece a liberdade e não a ama. Quanto a mim, assumo a minha solidão. Que às vezes se extasia como diante de fogos de artifício. Sou só e tenho que viver uma certa glória íntima que na solidão pode se tornar dor. E a dor, silêncio. Guardo o seu nome em segredo. Preciso de segredos para viver.”
“Se soubesses da solidão desses meus primeiros passos. Não se parecia coma solidão de uma pessoa. Era como se eu já tivesse morrido e desse sozinha os primeiros passos em outra vida. E era como se a essa solidão chamassem de glória, e também eu sabia que era uma glória, e tremia toda nessa glória divina primária que, não só eu não compreendia, como profundamente não a queria.”
“Fique de vez em quando só, senão você será submergido. Até o amor excessivo dos outros pode submergir uma pessoa.”
“E ninguém é eu. Ninguém é você. Esta é a solidão.”
Autor: Catherine Beltrão
Comment(1)
MIGUEL PENNA SATTAMINI DE ARRUDA says:
8 de janeiro de 2017 at 11:31Adoro suas pinturas. Solidão, melancolia e beleza. Muito linda a união com os poemas de Clarisse.
Suas pinturas me transportam para quando, em 1962, morei nos Estados Unidos, em Washington, vivendo solitariamente, do trabalho para casa, da casa para o trabalho. Solitário na lanchonete, solitário na rua, solitário no escritório. O sentimento é exatamente este das pinturas.