A concha da praia de Ipanema

Katia mora num casa que mais parece um museu. Tem muita coisa lá: móveis antigos, quadros, livros, fotos, e um monte de coleções: selos, conchas… Conchas? Como assim?

Ah, também é importante falar que Katia tem cinco netos.

Um dia, os cinco netos estavam lá na casa da avó. Uma escadinha: João Victor, com nove anos, Marina, com oito, Sofia, com seis, Maria Clara, com cinco e Lucas, o caçula, com dois.

– Vó, o que tem nesse pote? São conchas?, perguntou João Victor, o mais curioso, à sua avó.

Ipanema_poteconchasSão sim! E são lindas… olha essa então, é enorme! , respondeu a avó. E continuou:

Essa tem até história. Vocês querem que eu conte? 

Todos responderam que sim, uns com  a cabeça, outros com “hum, hum”, e o Lucas já querendo pegar as conchas no pote.

E Katia começou a contar a história da concha enorme e linda.

Era uma vez uma praia.  A Praia de Ipanema.

Mas eu conheço essa praia, vó! Já fui várias vezes… , interrompeu Maria Clara.

Edith_Ipanema4

“Três coqueiros e moça em Ipanema”, de Edith Blin. Década de 40, ost, 46 X 54cm

E Katia continuou a história:

Mas eu estou falando da praia de Ipanema de sessenta anos atrás. Era uma praia bem diferente da praia de Ipanema de hoje. A areia era limpinha, a água tinha muita espuma branca e os coqueiros balançavam com o vento…

Edith_Ipanema1

“Ipanema com morro Dois Irmãos”, de Edith Blin. 1949, ost, 33 X 41cm

– Havia dunas. Muitas dunas. Abraçando as dunas, um cobertor verde de vegetação rasteira salpicada com flores lilás.  O verde  contrastava com o bege claro da areia. Era areia que não acabava mais!

Puxa, que legal!, disse Marina. – Mas esses morros continuam lá, não continuam vó?

Edith_Ipanema3

“Morro Dois Irmãos e coqueiros”, de Edith Blin. 1950, pastel, 15 X 22cm

Continuam, sim, Marina., respondeu Katia. – E o por do sol visto da Pedra do Arpoador, divino, era o mesmo que se vê hoje. Mas os aplausos para a celebração vinham da alma, do coração. O silêncio da luz se despedindo na tarde finda se harmonizava mais com o vai e vem do som das ondas…

E as conchas, vó? , lembrou Sofia, a mais espevitada dos netos.

– As conchas? Nossa, quase que esqueci delas… Eram centenas, milhares, que as crianças apanhavam na areia, formando suas coleções e disputando as mais bonitas. Algumas conchas eram conquistadas por mergulhos mais ousados à beira-mar, atrás dos mais belos exemplares. 

E Katia, continuou sua prosa:

Um dia, eu fui uma dessas crianças que pegou uma concha na praia de Ipanema. Aliás, ela não estava na areia e eu precisei mergulhar para pegar a concha!

Ipanema_concha – Era uma concha enorme e linda. Ela ficava descansando no fundo do mar, sendo jogada pra lá e pra cá a cada onda que passava por cima dela.

Então a avó pegou com todo cuidado a concha de dentro do pote.

Que linda, vó!, falaram ao mesmo tempo Marina e Maria Clara.

Os meninos, João Victor e Lucas, ficaram só olhando, sem falar nada. E Sofia já queria pegar outras conchas no pote. E perguntou:

Mas e as outras conchas, vó? Foi você que pegou também?

Pois é, respondeu Katia. Quando eu pequei a concha grande e linda, percebi que havia várias outras conchas com ela, que também dançavam a “dança das conchas” no fundo do mar. Aí pensei: eu precisava pegar algumas outras conchas amigas pra que ela não ficasse sozinha…

– Então voltei vários dias para a praia e fui pegando as amigas conchas… , acrescentou a avó.

Nossa, vó, e você guardou essas conchas todo esse tempo? , perguntou a neta mais nova.

Edith_Ipanema2

“Ipanema”, de Edith Blin. 1949, ost, 38 X 46cm

Guardei, Maria Clara. Elas ficaram comigo por mais de sessenta anos, juntinhas nesse pote. Eu sabia que um dia eu teria netos que iriam me pedir para que eu contasse a história da concha da praia de Ipanema…

E não é que eu acertei?

Autor: Catherine Beltrão

Comments(3)

  1. Responder
    Marcia Leal says:

    Que lindo Catherine!!!

    Imaginei toda a história… foi maravilhoso! Parabéns!

    Bjs

  2. Responder
    Paulo Borges says:

    Parabéns Catherine, ou seria Kátia?
    Lindo texto que nos faz voltar ao nosso tempo de criança em que o Rio era realmente maravilhoso.
    Sucesso nessa nova empreitada como escritora.
    Saudade dos nossos encontros no seu “museu”.
    Grande abraço.

  3. Responder
    Taissa says:

    Amei!
    E pude imaginar toda história sendo revivida agora com as crianças, como é lindo ver tudo sendo contado e junto com as pinturas, é muito emocionante! Parabéns!!! 🙂
    Beijos da filha, da bisneta e tb mãe dos netos…rs

Comente