Katia mora num casa que mais parece um museu. Tem muita coisa lá: móveis antigos, quadros, livros, fotos, e um monte de coleções: selos, conchas… Conchas? Como assim?
Ah, também é importante falar que Katia tem cinco netos.
Um dia, os cinco netos estavam lá na casa da avó. Uma escadinha: João Victor, com nove anos, Marina, com oito, Sofia, com seis, Maria Clara, com cinco e Lucas, o caçula, com dois.
– Vó, o que tem nesse pote? São conchas?, perguntou João Victor, o mais curioso, à sua avó.
– São sim! E são lindas… olha essa então, é enorme! , respondeu a avó. E continuou:
– Essa tem até história. Vocês querem que eu conte?
Todos responderam que sim, uns com a cabeça, outros com “hum, hum”, e o Lucas já querendo pegar as conchas no pote.
E Katia começou a contar a história da concha enorme e linda.
– Era uma vez uma praia. A Praia de Ipanema.
– Mas eu conheço essa praia, vó! Já fui várias vezes… , interrompeu Maria Clara.
E Katia continuou a história:
– Mas eu estou falando da praia de Ipanema de sessenta anos atrás. Era uma praia bem diferente da praia de Ipanema de hoje. A areia era limpinha, a água tinha muita espuma branca e os coqueiros balançavam com o vento…
– Havia dunas. Muitas dunas. Abraçando as dunas, um cobertor verde de vegetação rasteira salpicada com flores lilás. O verde contrastava com o bege claro da areia. Era areia que não acabava mais!
– Puxa, que legal!, disse Marina. – Mas esses morros continuam lá, não continuam vó?
– Continuam, sim, Marina., respondeu Katia. – E o por do sol visto da Pedra do Arpoador, divino, era o mesmo que se vê hoje. Mas os aplausos para a celebração vinham da alma, do coração. O silêncio da luz se despedindo na tarde finda se harmonizava mais com o vai e vem do som das ondas…
– E as conchas, vó? , lembrou Sofia, a mais espevitada dos netos.
– As conchas? Nossa, quase que esqueci delas… Eram centenas, milhares, que as crianças apanhavam na areia, formando suas coleções e disputando as mais bonitas. Algumas conchas eram conquistadas por mergulhos mais ousados à beira-mar, atrás dos mais belos exemplares.
E Katia, continuou sua prosa:
– Um dia, eu fui uma dessas crianças que pegou uma concha na praia de Ipanema. Aliás, ela não estava na areia e eu precisei mergulhar para pegar a concha!
– Era uma concha enorme e linda. Ela ficava descansando no fundo do mar, sendo jogada pra lá e pra cá a cada onda que passava por cima dela.
Então a avó pegou com todo cuidado a concha de dentro do pote.
– Que linda, vó!, falaram ao mesmo tempo Marina e Maria Clara.
Os meninos, João Victor e Lucas, ficaram só olhando, sem falar nada. E Sofia já queria pegar outras conchas no pote. E perguntou:
– Mas e as outras conchas, vó? Foi você que pegou também?
– Pois é, respondeu Katia. Quando eu pequei a concha grande e linda, percebi que havia várias outras conchas com ela, que também dançavam a “dança das conchas” no fundo do mar. Aí pensei: eu precisava pegar algumas outras conchas amigas pra que ela não ficasse sozinha…
– Então voltei vários dias para a praia e fui pegando as amigas conchas… , acrescentou a avó.
– Nossa, vó, e você guardou essas conchas todo esse tempo? , perguntou a neta mais nova.
– Guardei, Maria Clara. Elas ficaram comigo por mais de sessenta anos, juntinhas nesse pote. Eu sabia que um dia eu teria netos que iriam me pedir para que eu contasse a história da concha da praia de Ipanema…
– E não é que eu acertei?
Autor: Catherine Beltrão
Comments(3)
Marcia Leal says:
19 de setembro de 2018 at 18:53Que lindo Catherine!!!
Imaginei toda a história… foi maravilhoso! Parabéns!
Bjs
Paulo Borges says:
19 de setembro de 2018 at 19:47Parabéns Catherine, ou seria Kátia?
Lindo texto que nos faz voltar ao nosso tempo de criança em que o Rio era realmente maravilhoso.
Sucesso nessa nova empreitada como escritora.
Saudade dos nossos encontros no seu “museu”.
Grande abraço.
Taissa says:
21 de setembro de 2018 at 02:00Amei!
E pude imaginar toda história sendo revivida agora com as crianças, como é lindo ver tudo sendo contado e junto com as pinturas, é muito emocionante! Parabéns!!! 🙂
Beijos da filha, da bisneta e tb mãe dos netos…rs