Girassóis

Diz a lenda grega que Clície era uma ninfa apaixonada por Hélio, o deus do Sol. Helio a trocou por sua irmã e Clície começou a enfraquecer. Ela ficava sentada no chão frio, sem comer e sem beber, se alimentando apenas das suas próprias lágrimas. Enquanto o Sol estava no céu, dirigindo sua carruagem de fogo, Clície não desviava dele o seu olhar nem por um segundo. Durante a noite, o seu rosto se virava para o chão, continuando então a chorar.  Seus pés ganharam raízes e o seu rosto se transformou em uma flor,  que continuou seguindo o Sol. E assim nasceu o primeiro girassol.

Mas o girassol não é uma flor. É uma inflorescência, formada por  flores dispostas de acordo com um esquema em espiral, 34 num sentido e 55 no outro.

Flor ou não, vários pintores trouxeram para suas telas este pedaço de Sol. Haja vista Vincent van Gogh (1853-1890), o mais célebre.

Girassois_VanGogh1

“Vaso com 14 girassóis”, de Vincent van Gogh. 1889.

Parece que Van Gogh pintou onze telas com girassóis. Difícil dizer a mais bela.  Quatorze deles foram pintados em uma obra, assim referida pelo pintor em uma carta a seu irmão Théo: “Sou intenso nisso, pintando com o entusiasmo de um marselhês comendo bouillabaisse, o que não vai surpreendê-lo quando você sabe que o que eu estou pintando são alguns girassóis. Se eu levar a cabo esta ideia, haverá uma dúzia de painéis. Então a coisa toda será uma sinfonia em azul e amarelo. Estou trabalhando nisso todas as manhãs desde o nascer do sol, pois as flores desaparecem tão rapidamente. Estou agora na quarta pintura de girassóis. Este quarto é um arranjo com 14 flores … dá um efeito singular.”

Paul Gauguin (1848-1903), contemporâneo de Van Gogh, dividiu com ele, por alguns meses, um cômodo da famosa Casa Amarela, em Arles, sul da França. Foi uma relação conflituosa, que culminou com a partida de Gauguin para Paris, testemunhada por uma carta deste ao mesmo Théo, irmão de Van Gogh: “Sou obrigado a voltar para Paris. Vincent e eu não podemos de modo algum continuar vivendo lado a lado sem atritos, devido à incompatibilidade de nossos temperamentos e porque nós dois precisamos de tranquilidade para nosso trabalho. Ele é um homem de inteligência admirável que tenho em grande estima e deixo com pesar, mas, repito, é necessário que eu parta.”

Girassois_Gauguin2

“Nature morte à l´Ésperance”, de Paul Gauguin – 1901

É famosa a obra “Nature morte à l´Ésperance“, em que Gauguin representa seu amigo pintando girassóis.

Voltemos um pouco no tempo. Claude Monet (1840-1926), o maior nome do Impressionismo, também pintou girassóis. Em vasos, colhidos de seu jardim de Vétheuil ou ainda florescendo  em seu jardim de Giverny.

Girassois_Monet1

“Ramo de girassóis”, de Claude Monet. 1881.

O inebriante “Ramo de girassóis” é inconfundível, trazendo o frescor do jardim para dentro de casa, contrapondo cores e impressões que somente Monet teria condições de executar.

E que tal um girassol pintado por Gustav Klimt (1862-1918)?

Girassois_Klimt2

“O Girassol”, de Gustav Klimt. 1907

Além da célebre obra “Fazenda de campo com girassóis“, é também de Klimt “O Girassol“, solitário e imponente, majestoso, reinando na tela entre dezenas de flores miúdas. O pintor, mestre do Art Nouveau, cujo centenário é comemorado neste ano, nunca deixa de surpreender, na delicadeza de sua pintura, na textura impressa por suas cores…

No Brasil, talvez o nosso maior pintor de flores seja Alberto da Veiga Guignard, ou mais simplesmente Guignard (1896-1962).

Girassois_Guignard

“Vaso de Flores”, de Alberto da Veiga Guignard. 1930

Nascido na cidade serrana de Nova Friburgo/RJ, cidade em que moro e trabalho e que recentemente me adotou como cidadã, o pintor das “paisagens imaginantes” foi extremamente generoso e profícuo em seu tema floral. Uma delas, a obra “Vaso de flores“, de 1930,   foi disputada por cinco compradores e finalmente arrematada na Bolsa de Arte de São Paulo por R$ 5,7 milhões, tornando-se a obra mais cara de um artista brasileiro vendida em leilão. Na obra, um imenso girassol impera, reverenciado e abraçado por centenas de pétalas e perfumes…

Autor: Catherine Beltrão

Comente