Há um amplo consenso entre antropólogos e geneticistas humanos de que, do ponto de vista biológico, raças humanas não existem. E, segundo várias pesquisas, a cor da pele não determina sequer a ancestralidade. Isso é especialmente verídico nas populações brasileiras, pelo seu alto grau de miscigenação. Já foi verificado que 87% dos brancos brasileiros apresentam pelo menos 10% de ancestralidade africana.
Muito além de qualquer discussão sobre raça e cor, este post apresenta algumas obras criadas por grandes artistas, representando o negro segundo sua cultura, a época em que viveu e sua verdade.
Peter Paul Rubens (1577-1640) pintou muitos retratos, especialmente de amigos e autorretratos, e, no final de sua vida, pintou diversas paisagens. Seus desenhos são muito vigorosos, mas não muito detalhados. Utilizou-se de estudos em óleo para preparar suas obras. Foi um dos últimos artistas a fazer uso consistente de painéis de madeira como meio de apoio, mesmo para obras grandes, e se utilizou também de lona, especialmente quando a obra precisaria ser enviada para lugares distantes. “Quatro estudos de uma cabeça de negro” foi uma das obras mais populares do pintor.
Marie-Guillemine Benoist (1768-1826) foi aluna de Jacques Louis David, principal representante da pintura neoclássica na França, e valeu-se das lições do mestre para realizar uma obra tipicamente neoclássica. O “Retrato de Mulher Negra” mostra uma mulher com postura rígida que está posando: o olhar é fixo, a intenção do olhar a faz indagar o espectador. Não está ali uma mulher em situação de sujeição, mas de provável escolha.
Jean-Baptiste Debret (1768-1848), assim como Benoist, também foi aluno de Jacques Louis David. Mas, ao contrário da mulher de Benoist, a vendedora que aparece em sua “Negra tatuada vendendo caju” está sentada no chão de forma mais espontânea, apoiando a cabeça com o braço, que por sua vez se apoia em suas pernas. A mulher de Benoist parece ter sido inserida em um ambiente que não é o seu, enquanto a mulher de Debret parece estar totalmente imersa naquele espaço.
O que predomina na tela “O Negro Cipião”, de Paul Cézanne (1839-1906) é a confrontação em total harmonia de grandes volumes cromáticos: o branco do móvel com as costas de Cipião, que, por sua vez, se sobrepõe ao fundo opaco, e também o azul intenso das calças. E, ainda, no braço direito do modelo, pequenas pinceladas amarelas e vermelhas, que poderiam ser os reflexos do ambiente. Belíssima obra doada ao MASP pelo Centro dos Cafeicultores do Estado de São Paulo.
O final do século XIX trouxe consigo a valorização da pintura de cenas de costumes, por vezes representadas em quadros de grandes formatos. Buscava-se atingir sentimentalmente o observador, comovendo-o diante da situação vivenciada pelos personagens, mas sem grande dramaticidade. Assim, a mulher negra poderia ser representada expressando seus sentimentos, não mais reduzida a elemento puramente exótico. “Limpando metais”, de Armando Vianna (1897-1992), não fugiu a essa regra: foi pintado exclusivamente para concorrer ao prêmio da 31ª Exposição Geral da Escola Nacional de Belas Artes. O artista conseguiu a medalha de prata e não mais representou mulheres negras.
No Brasil, uma obra que apresenta paralelo com “Limpando metais” é a célebre tela “A negra”, de Tarsila do Amaral (1886-1973). As duas entraram em cena no mesmo ano, 1923. Mas a obra da pintora modernista em pouco tempo ganhou fama. Produzida em Paris, “A negra” de Tarsila foi exibida com entusiasmo pelo importante artista francês Fernand Léger (1881-1955) aos seus alunos. Reproduzida na capa de um livro de poemas escrito por Blaise Cendrars (1887-1961), tornou-se rapidamente símbolo de ruptura absoluta. A obra reduz o corpo nu feminino a uma superfície plana e alaranjada, salientando tão somente suas características étnicas, incorporando à estética moderna um elemento de identidade nacional. A partir dela, o modernismo brasileiro produziu um número expressivo de representações de negros e mestiços.
No quadro “O Lavrador de Café”, de Cândido Portinari (1903-1962), o modelo aparece bem mais musculoso do que o normal . A figura deformada com pés e mãos enormes é o que aproxima Portinari ao expressionismo . Aumentar o tamanho do corpo de seus personagens era o jeito que o artista usava para mostrar a importância do trabalhador brasileiro.
Ao fundo temos inúmeras figuras de pés de café, tanto na superfície plana como nos morros. Percebe-se que parte das plantações dos pés de café já está indo em direção ao espaço reservado para seleção e ensacamento. Com esses detalhes, percebe-se a superprodução ai registrada. O olhar do lavrador é expressivo e nele predomina a preocupação. Tem-se a impressão de que ele sente a ação devastadora da exploração que o homem faz na natureza.
Palavras de Emiliano Di Cavalcanti (1897-1976): “A mulata, para mim, é um símbolo do Brasil. Ela não é preta nem branca. Nem rica nem pobre. Gosta de dança, gosta de música, gosta do futebol, como o nosso povo. Imagino ela deitada em cama pobre como imagino o país deitado em berço esplêndido.” E palavras do crítico Frederico de Morais, por ocasião da retrospectiva de DI no MAM, em 1971: “Altaneiras, monumentais quase sempre, alegres ou sonhadoras, em devaneios – o gato no colo, a flor sobre o busto – apenas por alguns momentos o olhar parece triste ou vago. Porque, hedonista nato, amoroso da vida e das pessoas, Di não se deixa abater pelos problemas existenciais, pela inquietação política ou social. Coisas mais próprias para os espíritos magros.”
Edith Blin (1891-1983) embora tenha pintado poucos negros, estas obras são muito significativas em sua produção. Além da emblemática obra “Carnaval!”, sua magnífica “Negra com lençol azul” dignifica uma raça, dignifica uma origem, dignifica um Brasil. O amarelo, o verde e o azul envolvem a altivez majestosa desta mulher negra, segura de si, de seu passado, presente e futuro. Ambas criações dos anos 40, mostram uma total integração da artista com o contexto do país que a acolheu.
Este post não posso chamar de autoral pois os textos referentes aos pintores foram quase todos extraídos de conteúdos existentes da Internet.
Autor: Catherine Beltrão