Arte erótica não é pornografia

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“Psique reanimada pelo beijo de Eros”, de Antonio Canova – escultura em mármore, 1787-1793, 155 X 168cm

Segundo a mitologia grega, Eros é o deus do Amor. Muito belo e irresistível, levando a ignorar o bom senso, atribui-se a Eros um papel unificador e coordenador dos elementos. Mas Eros também é responsável pela criação da sexualidade que, dependendo dos costumes ou da moral através dos tempos, se transforma em tabu, que irá significar uma proibição convencional, de maior ou menor repressão.

De Eros passamos à arte erótica. Mas o que é arte erótica?

Encontramos na Wikipédia a seguinte definição: A arte erótica é o termo que reúne qualquer manifestação artística destinada a evocar o erótico ou descreve cenas de sexualidade humana. Inclui pinturas, gravuras, desenhos, esculturas, fotos, músicas e literatura.

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Vênus Kostenky, 10,2cm.  23.000 a 21.000AC

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Venus de Willendorf, 11,1cm. 30000-23000 AC.

Encontram-se manifestações de arte erótica em todas as partes do mundo, em todas as culturas. Desde os tempos paleolíticos até os nossos dias, esta arte foi se desenvolvendo, adquirindo traços e nuances das culturas de cada povo onde era criada. As mais antigas peças encontradas até hoje são a Vênus de Willendorf (Áustria),  esculpida em calcário oolítico com idade aproximada variando de 30.000 a 23.000AC e a Vênus  Kostenky (Rússia), esculpida em marfim de mamute, com idade que varia de 23.000 a 21.000AC, ambas do período paleolítico.

Outra manifestação de arte erótica mundial são as esculturas externas de templos em Khajuharo, na Índia. O conjunto destes templos foi construído ao longo de cem anos, de 950 a 1050, restando atualmente cerca de 22 dos 80 construídos na época.

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Esculturas nas paredes externas de templo em Khajuraho. Séculos IX e X. Índia.

São um exemplo da ligação entre a religião e o erotismo, mas a representação das cenas eróticas ou de sexo são sempre entre figuras humanas e não entre divindades e estão sempre nas paredes externas dos templos.  Isto significa que o visitante crente que pretendia estar perto da divindade, deveria deixar os seus desejos sexuais fora do templo.

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Posição ilustrada no Kama Sutra

Da Índia também vem o manual Kama Sutra,  um antigo texto sobre o comportamento sexual humano, amplamente considerado o trabalho definitivo sobre amor na literatura sânscrita. O texto foi escrito pelo poeta Vatsyayana, como um breve resumo dos vários trabalhos anteriores, e que teria sido composto entre o século I e VI da Era Cristã. A difusão do Kama Sutra no Oriente sempre se deu dentro de uma atmosfera religiosa. Era uma espécie de livro santo, e a técnica do amor sexual era compreendida como forma de alcançar o estado divino. Na educação oriental o sexo era encarado como filosofia, e muitos livros da antiguidade chinesa ou japonesa levam a crer que o sexo era considerado também uma manifestação artística, de grande poder de criação.

Como exemplos da arte erótica ocidental dos últimos 200 anos, nomes como Picasso, Di Cavalcanti, Wambach,  Rodin, Degas, Manet e Courbet são somente alguns dos que se aventuraram a trilhar também este caminho, paralelo ao grande legado que cada um deles deixou para a humanidade. Senão, vejamos.

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“Nessus et Dejanire”, de Picasso. Desenho, 1920, 21,3 X 27,3cm

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“Erotico”, de Di Cavalcanti. Nanquim sobre papel, 1967, 30 X 22cm

Pablo Picasso (1881-1973), pintor e desenhista espanhol, foi de uma liberdade mais total como desenhista do que como pintor. A malícia, o humor grotesco, a inventiva fantástica, são qualidades constantes de sua obra, além do traço livre e ligeiro, que dá ideia de uma criação instintiva e fluente. Os desenhos eróticos de Picasso ficaram conhecidos a partir dos anos 70. Uma verdadeira explosão de sexo explícito.

Pintor brasileiro, Di Cavalcanti (1897-1976) nasceu e morreu no Rio de Janeiro. Um dos principais componentes da Semana de Arte Moderna de 1922, em São Paulo, Di é um dos mais típicos dos nossos pintores pela sua temática popular, que inclui o carnaval carioca, paisagens de subúrbios cariocas e mulatas sensuais. Di Cavalcanti, já no final da vida, produziu vários desenhos extremamente eróticos.

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“Olympia”, de Edouard Manet. 1873, ost, 130,5 X 190cm

Edouard Manet (1832-1883) é considerado precursor do Impressionismo, tendo nascido e morrido em Paris. “Olympia” foi o primeiro nu da pintura impressionista, obra prima hoje considerada uma das peças mais importantes da arte moderna.

Gustace Courbet (1819 – 1877), pintor francês, deixou obras cujo realismo fez escândalo. Entre elas,  “Le Sommeil”, encomenda ao artista em 1866 por Khalil-Bey, antigo embaixador da Turquia em São Petersbourg e que morava naquela época em Paris, desponta como símbolo de lesbianismo expresso.

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“Le sommeil”, de Gustave Courbet. 1866, ost, 135 X 200cm

 

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“Nu”, de Georges Wambach, aquarela.

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“Femme assise sur le rebord d’une baignoire et s’épongeant le cou”, de Edgar Degas.1880, ost, 51 X 62cm

Georges Wambach (1901-1965), pintor belga, morreu no Rio de Janeiro. Um dos maiores nomes da iconografia brasileira, tendo deixado um legado imenso de aquarelas e bicos de pena representando vários lugares do Brasil, também teve sua fase erótica em grande estilo, mas que, até hoje, é conhecida por pouquíssimos privilegiados.

Edgar Degas (1834-1917), pintor francês, é bastante conhecido pelas suas bailarinas, mas ele também pintou mulheres nuas recostadas ou tomando banho em suas banheiras. São dele estas palavras: Jusqu’à présent, le nu avait toujours été représenté dans des poses qui supposent un public. Mais mes femmes sont des gens simples… Je les montre sans coquetterie, à l’état des bêtes qui se nettoient . (Até agora, o nu tinha sido sempre representado em poses que supõem ter plateia. Mas minhas mulheres são pessoas simples… eu as mostro sem produção, como se fossem animais que se limpam.)

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“Le baiser”, de Auguste Rodin. Mármore, 1888/89, 181,5 X 112,3cm

Como último exemplo, o grande Auguste Rodin (1840 – 1917), escultor francês, ficou imortalizado pelas suas esculturas perfeitamente esculpidas em mármore e bronze, a ponto de o acusarem de ter feito uso de modelos vivos como molde. O Hotel Biron, onde morou em seus últimos anos de vida, é hoje o Museu Rodin, onde se encontram várias de suas obras, inclusive a famosa “Le Baiser”.

A intenção que tive, ao escrever e publicar este post, é tentar mostrar a beleza e a importância da arte erótica no contexto da arte como um todo, estando este tipo de arte ligado à cultura e à evolução dos costumes dos povos através dos tempos. Totalmente diferente do conceito de pornografia que está associada à vulgaridade, à banalidade e ao descartável.

 Autor: Catherine Beltrão

Comments(2)

  1. Responder
    João Reguffe says:

    Olá
    Existem trabalhos de Gombach sobre o Rio G. do Sul?
    E livro de arte erótica desse artista?
    Saudações.
    João

    • Responder
      Catherine Beltrão says:

      Prezado João Reguffe,
      Infelizmente não temos nenhuma informação referente ao artista de nome Gombach. Você poderia nos fornecer mais alguns dados (primeiro nome, nacionalidade)?
      Saudações,
      Catherine Beltrão

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