Resolvi comemorar o primeiro aniversário do blog ArtenaRede falando de flores. Tendo escolhido o tema, é natural que apresentasse neste post obras do mestre Monet, com as flores do seu grandioso Jardim de Giverny, ou com os vigorosos girassóis de van Gogh, ou ainda com as maravilhosas composições florais de Guignard.
Mas não escolhi essa vertente. Resolvi, desta vez, apresentar fotos. E também não serão apresentadas imagens de grandes e renomados fotógrafos. Neste post, as fotos são minhas, tiradas no Jardim dos Poetas, com exceção de uma, tirada na praça Getúlio Vargas, em Nova Friburgo. Estas imagens irão tão somente emoldurar a letra antológica da música “Pra não dizer que não falei das flores“, também conhecida como “Caminhando” (ou será o contrário?), de Geraldo Vandré (1935).
Em 1968, a música participou do III Festival Internacional da Canção da TV Globo, ficando em segundo lugar, sob as vaias ensurdecedoras do público perante o primeiro lugar dado à belíssima “Sabiá“, de Tom Jobim e Chico Buarque. “Pra não dizer que não falei das flores” teve sua execução proibida durante anos, após tornar-se um hino de resistência do movimento civil e estudantil que fazia oposição à ditadura militar brasileira.
Em 1968, eu cursava o meu primeiro ano de Engenharia na PUC/RJ. Abençoada mais uma vez, eu estava na plateia de um auditório lotado de jovens que, como eu, tinham ido ver o Vandré e ouvir a canção.
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não
Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer
Pelos campos há fome
Em grandes plantações
Pelas ruas marchando
Indecisos cordões
Ainda fazem da flor
Seu mais forte refrão
E acreditam nas flores
Vencendo o canhão
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer
Há soldados armados
Amados ou não
Quase todos perdidos
De armas na mão
Nos quartéis lhes ensinam
Uma antiga lição
De morrer pela pátria
E viver sem razão
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer
Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Somos todos soldados
Armados ou não
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não
Os amores na mente
As flores no chão
A certeza na frente
A história na mão
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Aprendendo e ensinando
Uma nova lição
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer
Para quem quiser ouvir a canção, na voz do próprio Geraldo Vandré, clique aqui. Trata-se de um vídeo-montagem, com fotos da época e áudio extraído do III Festival Internacional da Canção, em 1968.
Alguns anos se passaram desde 1968. Na verdade, quase meio século! Os anos 60 eram os anos de “paz e amor”. A juventude acreditava na força das flores para combaterem as armas da ditadura. Que era importante caminhar e cantar, junto ou sozinho, para fazer a hora. Que era preciso, sobretudo, jamais esperar.

Últimas flores do monumental eucalipto tombado na praça Getúlio Vargas, em 28.01.2015. Autor: Marcelo Brantes.
Passado esse tempo, em que podem estar acreditando os jovens de hoje? Será que acreditam em alguma coisa? Com certeza, as flores murcharam. Com certeza, as lágrimas foram rareando até as águas dos rios secarem. E, com certeza, as árvores também continuam tombando, dia após dia.
Este post é uma homenagem à Odete Lara, falecida hoje, 04.02.2015. Acima, a artista junto a Tonia Carrero, Eva Vilma, Norma Benguell e Cacilda Becker, na Passeata dos Cem Mil, um dos mais importantes protestos contra a ditadura militar, em junho de 1968, nas ruas do centro do Rio de Janeiro.
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer
Autor: Catherine Beltrão
Comments(4)
Eduardo Vieira says:
8 de fevereiro de 2015 at 14:33Fico muito feliz com esse post.
Lembro de nossas conversas, há um pouco mais de um ano atrás, onde projetávamos cenários(por vezes sombrios) em relação a alguns determinados assuntos, dos planos que surgiam a partir de algumas conversas que voce estava tendo à epoca, e do que poderíamos ter em médio e longo prazo.
Lembro do brilho em seus olhos quando sugeri a ideia do blog, e comecei a explicar os meandros e a dinamica desse ambiente novo que voce passaria a transitar, trazendo qualidade, conteúdo de alta qualidade, consistencia e disciplina para constante atualizacao.
Lembro da dificuldade inicial para se achar um caminho de partida, assim como lembro das primeiras ideias de conteudo. Como sempre falei: a web é organica e o caminho vai sendo achado e transformado. Com a qualidade de conteudo que temos, e principalmente, por termos voce (lembra que sempre afirmei que voce nao pode deixar de ser voce, justamente pela autenticidade necessaria ao blog) é questao de tempo (e paciencia) colher frutos ainda maiores. Que virão. Estou certo disso!
Parabens! e obrigado!
Catherine Beltrão says:
9 de fevereiro de 2015 at 03:09Eduardo, com toda certeza, sem a sua parceria, serena e constante, este projeto não teria chegado ao fim do seu primeiro ano. Aprendi muito com nossas conversas, sobretudo a segurar minha ansiedade, inerente a quem deseja realizar o que sonha.
O que mais me encanta neste processo evolutivo do blog é sua característica orgânica, como você diz, parecendo as águas de um rio que vai se ajustando, se adaptando aos recortes dos morros e vales, desenhando seu leito, que também está sujeito a ventos e tempestades.
Eu é que tenho a lhe agradecer, amigo-alicerce…
Lucíola Viegas says:
9 de fevereiro de 2015 at 01:55Parabéns Querida Catherine, por esta iniciativa de criar o blog. Obrigada por compartilhar conosco sua riqueza cultural, seu conhecimento, seus poemas, sua visão, suas fotos, enfim, sua sensibilidade humana e sua arte, que tanto enriquece as pessoas que passam por aqui. Forte Abraço. Lucíola Viegas
Catherine Beltrão says:
9 de fevereiro de 2015 at 03:22Queridíssima Lucíola, uma das coisas que mais gosto é escrever . Para escrever, eu preciso pesquisar ou trazer à tona pedacinhos de minha memória. Isso já faz parte do caminho que me conduz à tão famosa felicidade. Agora, quando partilho estes escritos e alguém vem me fazer companhia neste trajeto, nem que seja por alguns minutos, como você fez agora, então… meu coração pulsa mais forte, chegando até a cantar! Muito obrigada, amiga!