Kokoschka e Soutine, a manifestação do expressionismo dilacerado

Desde os meus primeiros anos, convivi com livros e imagens de obras de arte. Mas não eram só  obras de Monet, Renoir ou Degas, expoentes do impressionismo bucólico ou dançante. Sem fazer trocadilhos, o que me impressionava mesmo eram as imagens fortes e dilacerantes de Kokoschka e Soutine, grandes nomes do expressionismo.

O expressionismo foi um movimento artístico e cultural de vanguarda surgido na Alemanha no início do século XX, que atravessou os campos artísticos da arquitetura, artes plásticas, literatura, música, cinema, teatro, dança e fotografia.

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“Autorretrato”, de Oskar Kokoschka

 

Oskar Kokoschka (1886-1980) foi um pintor expressionista e escritor austríaco. Recebeu a influência de Van Gogh e também do passado clássico, sobretudo o barroco, via Rembrandt e a escola veneziana, via Tintoretto e Veronese. Também esteve ligado à figura de Klimt, seu professor. Contudo, criou o seu próprio estilo pessoal, visionário e atormentado. Em um espaço denso e sinuoso, submergem as figuras, que parecem estar sendo sugadas por uma corrente centrífuga, produzindo um movimento espiral.

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“Os pagãos”, de Oskar Kokoschka. 1915.

A sua temática costumava ser o amor, a sexualidade e a morte, dedicando-se também por vezes ao retrato e à paisagem. As suas primeiras obras tinham um estilo medieval e simbolista próximo dos Nabis ou da época azul de Picasso. Desde 1906, em que conheceu a obra de Van Gogh, começou num tipo de retrato de corte psicológico, que visava a refletir o desequilíbrio emocional do retratado, com supremacia da linha sobre a cor.

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“A noiva do vento”, de Oskar Kokoschka. 1914.

As suas obras mais puramente expressionistas destacam-se pelas figuras retorcidas, de expressão torturada, como “A noiva do vento“. É uma obra de ser vista em silêncio, porque ela grita. Chora. Sofre pela harmonia que existe entre a presença e a ausência. A presença da mulher – a sua mulher, Alma – e a ausência do homem, já morto – a de Gustav Mahler, o eterno fantasma/amante de Alma, jamais por ela esquecido.  Nesta obra, Kokoschka reconhece a utopia, a fragilidade e o fracasso pela ilusão de ser amado por uma mulher que não se livrará do passado.

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“Amantes com gato”, de Oskar Kokoschka. 1917.

A partir de 1920 Kokoschka dedicou-se mais à paisagem, com um certo aspecto barroco, de pincelada mais leve e cores mais brilhantes.

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“Autorretrato”, de Chaim Soutine.

Chaïm Soutine (1893 -1943) foi um pintor expressionista da Escola de Paris. Sua produção foi muito influenciada por artistas como Cézanne, Rembrandt e El Greco. Pintava de forma delirante, como possuído por um ataque febril, precipitando as cores na tela.

Seus quadros apresentam uma textura pastosa e também uma grande força cromática. Foi comparado com o grande mestre pós-impressionista Van Gogh, cuja obra Soutine admirava. Por outro lado, artistas da época o comparavam com Oskar Kokoschka pois, como este, tinha a capacidade de captar tipos psicológicos em seus retratos.

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“O pequeno pasteleiro com um lenço vermelho”, de Chaim Soutine. 1914.

Nunca foi capaz de pintar senão com um modelo à sua frente.

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“Carcaça de boi”, de Chaim Soutine. 1925.

 

Soutine horrorizou seus vizinhos certa vez, por manter uma carcaça de animal em seu estúdio, para que pudesse pintá-la. O fedor fez com que os vizinhos chamassem a polícia, a quem Soutine prontamente dissertou sobre a importância relativa da arte acima da higiene.

A sua personalidade violenta e autodestrutiva provocava uma relação apaixonada com a sua obra, levando-o muitas vezes a romper os seus quadros, e refletindo-se numa pincelada forte e incontrolada e uma temática angustiosa e desolada. É o caso desta obra – “Carcaça de boi“, inspirada no “Boi esfolado” de Rembrandt.

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“Enfant de coeur”, de Chaim Soutine. 1927/28.

Pintor impulsivo e espontâneo, Soutine tinha uma necessidade pungente de registrar imediatamente na tela a sua emotividade interior, motivo pelo qual as suas obras carecem de qualquer preparação prévia.

Kokoschka e Soutine. A determinação compulsiva da angústia na arte.

Autor: Catherine Beltrão

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