Edith Blin (1891-1983), artista plástica, nasceu em Pontorson, França e morreu no Rio de Janeiro. Autodidata, começou a pintar nos anos 40, já no Brasil, motivada pela necessidade interior de expressar o sofrimento de seu povo ante os horrores da Segunda Guerra Mundial.
O tema Retrato acompanhou Edith em suas quatro décadas de trajetória na pintura. Foram muitos os seus modelos, retratados nas mais variadas técnicas: óleo, pastel, aquarela, crayon. Mas, sem dúvida alguma, uma modelo se destacou, sua neta Catherine. Dela, Edith realizou nada menos do que 129 retratos, desde quando a neta era bebê até às vésperas de sua morte, quando Catherine tinha 32 anos.
Depoimento de Catherine, em 2006:
“A sensação de ser retratada por um grande artista é extremamente gratificante. Se este artista é a pessoa que criou você, e consequentemente conhece muito você, é mais gratificante ainda. E se este artista tem como singularidade maior o fato de expressar os sentimentos – dele e do modelo – na obra que produz, aí é a glória! E eu fui glorificada nada menos do que 129 vezes, durante um período de 32 anos, desde o meu nascimento. De bebê a mulher feita, entre desenhos, aquarelas, pastéis e óleos, servi de modelo para Edith Blin. Como ambas gostávamos muito de música clássica, Bach, Beethoven, Chopin, Liszt, Debussy e Villa-Lobos eram presenças constantes nestes encontros entre pintora e modelo. As horas que passei posando para a criação de obras eternas foram das mais significativas da minha vida. Foram horas de comunhão com a Arte, de intensa interação com o processo de criação de uma artista maior. Hoje, percebo que esta comunhão e esta interação fundamentaram minha vida a tal ponto que a minha procura de felicidade passa através da Arte e de seu processo de criação.
Participei de todas as décadas e de todas as técnicas do processo criativo de Edith. Tendo nascido no final da década de 40, nesta época servi de modelo para vários desenhos feitos a carvão e a lápis em folhas de caderno de desenho. Na década de 50, fui retratada em alguns óleos e vários pastéis sobre cartolina, azul claro ou rosa. A maioria destes pastéis eu posei com dois objetos de estimação, que conservo até hoje: um palhacinho vestido de macacão listrado em vermelho e branco e um ursinho de pelúcia preto, o “Teddy”. São dezenas de retratos, em que a menina Katia – meu apelido quando criança – aprendia a ser modelo e a se encantar com os trabalhos feitos. Foi também nesta década que Edith começou a utilizar cartolina preta como suporte para os trabalhos feitos em pastel. Os traços de menina, sobre fundo preto, não perdiam de forma nenhuma sua delicadeza e ingenuidade, muito pelo contrário, realçavam toda a pureza que existia…
A década de 70, Edith octogenária e eu na faixa dos vinte e tantos anos, foi para ambas uma época de total entendimento artístico. Com um simples olhar de minha avó, eu já sabia que ela queria que eu posasse. Prontamente, eu atendia seu pedido e lá surgia mais uma obra fantástica, dessa mulher incrível em sua energia e entusiasmo! Tendo a música quase sempre como companhia, a produção dos óleos sobre cartolina preta imperava e, quando Edith não gostava do resultado, era mais uma cartolina rasgada… Posei as últimas vezes para Edith no ano de 1980, entre um derrame cerebral e outro.
Após 32 anos de convivência e centenas de horas tendo posado para 129 obras de Edith Blin, tenho absoluta certeza que um pedaço de sua alma faz parte da minha”.
Mais informações sobre Edith Blin e sobre Catherine Beltrão.
Autor: Catherine Beltrão
Comments(4)
Taissa says:
17 de fevereiro de 2014 at 23:45A obra de Edith é maravilhosa… realmente é algo incrível poder ver a história da obra e da minha mãe ser retratada por esta fabulosa artista, minha bisavó!
Parabénssss!
Catherine Beltrão says:
18 de fevereiro de 2014 at 00:35Obrigada, filha! Realmente, é algo sublime ter tido este privilégio…
Ana Amélia Costa says:
6 de julho de 2015 at 16:17Obras maravilhosas, oriundas de uma relação não menos maravilhosa entre neta e avó, entre modelo e artista. A pintura, surgida como necessidade de expressão e de registro de fragmentos de memórias, transformou-se em vida. A de Edith e a de Catherine. Sorte a de nossos olhos, convidados a pousar nessa intimidade compartilhada. Merci à vous.
Catherine Beltrão says:
6 de julho de 2015 at 16:52Ana Amélia, fico bastante emocionada em ler este seu registro sobre os 129 retratos. Digo “fico” no presente, pois são palavras que já li e reli várias vezes e, com toda certeza, voltarei a ler inúmeras vezes. Você captou perfeitamente a cumplicidade existente entre Edith e eu, o que permitiu a realização destas obras fantásticas. E, talvez você perceba agora a importância que dou à necessidade de valorizar a obra desta artista que tive a bênção de ser neta-filha-modelo…