Da série “Quase cinzas de uma obra permanente”: França livre

Dando prosseguimento à série “Quase cinzas de uma obra permanente“, apresentando os registros mediáticos de algumas obras da artista francesa Edith Blin (1891-1983), a vez agora é da obra “França livre“, de 1943.

É bom salientar que Edith pintou esta tela poucos meses depois de começar a desenhar tudo o que via pela frente e a mexer nos pincéis. A obra, produzida em solo brasileiro mas com a alma junto aos seus compatriotas franceses, participou da sua primeira exposição, realizada no Palace Hotel/RJ.

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“França livre”, de Edith Blin. 1943, ost.

Em março de 1943, a revista “Sombra”,  em sua edição de n• 16, publicou a matéria “A Arte não tem idade“, de autoria do célebre Jean Manzon. Abaixo, um trecho da matéria:

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Matéria na revista “Sombra”, de março 1943. Na foto, Edith segura duas telas, sendo uma delas a “França livre”.

“… Em uma ruazinha de Copacabana há uma casa – pequena e sem importância, não fora o que significam os seus moradores. São franceses exilados, porém franceses que vivem e respiram a luta incessante que alimenta as veias da França gloriosa. São duas senhoras: uma avó normanda e sua filha.

A primeira trouxe consigo o sotaque dos pescadores do Mont Saint Michel e o bom gosto que os normandos tem pelos calvados. Ela nos conta intermináveis histórias sobre as três guerras que atravessou – 1870, 1914, 1939 – e não tarda em chegar à definição rápida e conclusiva: “On les aura, ces sales boches!”. E é com ela que está a razão.

Sua filha, sra. Edith Blin, devotou-se à pintura com a mesma inspiração e fervor com que os monges se entrega a sua religião. A arte é relativamente nova para ela, que vem pintando há apenas seis meses. Mas o que ela pinta é expressivo e eloquente, porque em suas telas ela derrama tudo o que a inquieta e faz sofrer, tudo aquilo por que ela chora e gostaria de clamar ao mundo. Trabalha infatigavelmente.   …

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Matéria publicada no jornal “Carioca”, em 1943. No cavalete, a obra “França livre”.

Durante o seu primeiro ano de pintura, muito foi publicado em jornais e revistas da época, acerca do “fenômeno” Edith. Uma dessas matérias foi a apresentada no jornal “Carioca”, em seu n• 387, intitulada “Exposição de arte da sra. Edith Blin“:

Em sua residência, à rua Miguel de Lemos, em Copacabana, a sra. Edith Blin fez há dias uma exposição de seus quadros. Mme. Edith Blin é uma pintora de grande expressão. As telas que tem pintado revelam bem a força de sua originalidade e o poder que possue de transmitir a emoção e a vida através das fisionomias que retraça. Damos nessa página alguns flagrantes tomados na residência da ilustre pintora, bem assim a reprodução de alguns de seus quadros“.

De 15 de outubro a 3 de novembro, Edith fez sua primeira exposição, no Palace Hotel do Rio de Janeiro. Muitos registros foram feitos em revistas e jornais. Um destes registros, na revista Ilustração Brasileira, n• 103, de novembro 1943, apresentou uma bela foto com várias obras da exposição, estando entre elas a “França livre“, acompanhada do texto “A primeira exposição de Edith Blin“:

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Publicação na revista “Ilustração Brasileira”, de novembro de 1943.

No salão nobre do Palace Hotel e sob o patrocínio da Associação dos Artistas Brasileiros, Edith Blin acaba de expor as suas telas, encantando e surpreendendo a todos quantos lá estiveram, pela beleza e originalidade das composições apresentadas e principalmente por se tratar da primeira exposição da inspirada artista.

Jarbas de Carvalho, presidente da A. A. B., assim se expressou sobre Edith Blin:

Edith Blin expõe pela primeira vez. Não pegou pincéis em sua adolescência. Ao contrário, só depois de mulher feita é que sentiu a sugestão e começou a pintar, já com mão firme. Discípula de Georges Wambach, não se demorou ao calor de sua alta inspiração: libertou-se logo, adquirindo força, valor peculiar, como a crisálida que rompe o casulo para ser ninfa e voar com as próprias asas. Vendo suas telas, ninguém dirá que está diante de obra de mestre. Revelarão talvez recursos técnicos ainda não atingidos. Mas, é uma pintura diferente, onde se sente caráter individual e energia interior”.

França livre” é uma das primeiras obras pintadas por Edith Blin. Mais de 70 anos se passaram desde então. A força expressiva desta obra magnífica só fez aumentar no decorrer das décadas. O olhar destemido da mulher com o filho recém-nascido no colo, envolta nas cores da bandeira francesa, clamam por liberdade. Com ou sem igualdade. Com ou sem fraternidade. Mas liberdade acima de tudo.

Para quem tiver curiosidade de ler mais posts sobre a série “Quase cinzas de uma obra permanente“, clique nos links abaixo:

“Carnaval e quase cinzas… de Edith Blin” (post que deu origem à série); “Quase cinzas de uma obra permanente”: Piéta (parte I) ; “Quase cinzas de uma obra permanente”: Piéta (parte II); “Quase cinzas de uma obra permanente”: Marquesa; “Quase cinzas de uma obra permanente”: Junho 1940.

 Autor: Catherine Beltrão

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