Palhaço, pelúcia e bonecas… não precisa ser Natal.

O clima de Natal nos remete à infância. Nestes dias é quase impossível não nos lembrarmos de como eram os natais de quando éramos crianças. De quando ainda acreditávamos na existência deste personagem balofo, de roupas vermelhas, botas e cinto pretos e longa barba branca. De quando a ansiedade não cabia mais no coração, à espera daquele presente tão desejado (e merecido, segundo nós). De quando havia mais música, mais abraços e mais alegria no ar…

Eu, particularmente nestes dias que antecedem o Natal, me lembro do palhacinho, do urso de pelúcia e de duas bonecas.

Edith - Katiacombonecas

“Retrato de Katia com bonecas” , de Edith Blin – 1955 – pastel sobre cartolina – 63 X 49cm

Aqui transcrevo um pequeno trecho do texto que escrevi neste blog, para o post “Os 129 retratos“:

Edith - palhacinhoeursoII

“Palhacinho e urso I”, de Edith Blin – 1954 – pastel sobre cartolina – 48 X 30cm

Edith - palhacinhoeurso

“Palhacinho e urso II”, de Edith Blin – 1956 – pastel sobre cartolina – 50 X 35cm

Participei de todas as décadas e de todas as técnicas do processo criativo de Edith. Tendo nascido no final da década de 40, nesta época servi de modelo para vários desenhos feitos a carvão e a lápis em folhas de desenho. Na década de 50, fui retratada em alguns óleos e vários pastéis sobre cartolina, azul claro ou rosa. A maioria destes pastéis eu posei com dois objetos de estimação, que conservo até hoje: um palhacinho vestido de macacão listrado em vermelho e branco e um ursinho de pelúcia preto, o “Teddy”. São dezenas de retratos, em que a menina Katia – meu apelido quando criança – aprendia a ser modelo e a se encantar com os trabalhos feitos.

Quem me conhece um pouco mais ou quem já leu o post, já sabe quem é Edith. Edith Blin, artistavó, foi minha cúmplice e meu norte, nas três primeiras décadas de minha vida. Fui seu modelo em 129 trabalhos, o que representa centenas de horas me deixando esboçar, desenhar, pintar.  A mim e a meus amigos diletos na década de 50: o palhacinho vermelho e branco, o ursinho preto “Teddy”, a boneca ruiva e o “baigneur” de olhos grandes.

Edith - Katiacompalhacoeurso

“Katia com palhaço e urso”, de Edith Blin – 1956 – óleo sobre tela – 61 X 50cm – Meus amiguinhos inseparáveis, o palhacinho e o Teddy, e atrás o “baigneur”

Passei vários natais de minha infância brincando com estes amigos. No decorrer das décadas, as bonecas se foram. O palhacinho e o Teddy permaneceram ao meu lado. Suas peles também enrugaram. Cicatrizes apareceram. Nos corpos e nas almas. Nas deles e na minha. Mas o laço que nos une permanece apertado. Fazendo dos entrenatais um Natal permanente.

Autor: Catherine Beltrão

Comments(5)

  1. Responder
    Annelise Gripp says:

    Excelente texto minha amiga!
    Você conseguiu descrever os sentimentos que viveu naquela época com tantos detalhes, que nos remete aos sentimentos e cenários que passou.
    Natal é uma época magica que nos traz boas lembranças, boas acoes e muitas emoções.
    Parabéns pelo post!

    • Responder
      Catherine Beltrão says:

      Annelise, grande amiga: fico extremamente feliz que este texto tenha proporcionado a você um mergulho nos sentimentos e cenários natalinos de sua infância também. É muito bom revisitarmos os bons momentos de nossas vidas, pois eles nos ajudam na decisão de saber o que descartar e o que levar em nossa trajetória restante.

  2. Responder
    Angela Affonso says:

    Texto lindo e emocionante, numa época em que vivemos Natais tão diferentes daqueles da nossa infância.

  3. Responder
    Eduardo Vieira says:

    Catherine,
    seu texto brilhou, para meus olhos, como boa música ressoando em meus ouvidos. Com muito lirismo e emoção, suas palavras trazem ‘a tona alguns dos conceitos que tenho estudado, não só em minha carreira profissional como na vida, ao ampliar nosso olhar para a relação afetiva entre as pessoas e os “artefatos de memória” ou objetos aparentemente sem utilidade funcional ou mesmo materialidade física, mas que desempenham a importante função de “fazer lembrar”.

    A relação que voce nos apresenta com suas pelúcias infantis é um relato que confirma como os artefatos têm “competência emocional” e como é intrinsecamente humana essa relação afetiva entre as pessoas e o entorno projetado.

    Um de meus projetos de vida busca justamente isso: prover a vida das pessoas desta mágica, desta inocencia e um olhar de mundo especialmente bom que só a infancia consegue proporcionar. E tudo isso a partir desses objetos de afeto, desses artefatos em que depositamos amor, carinho, e que caminham conosco, absorvendo e sintetizando nossas memórias, cheiros, cenarios, texturas, sons e recordacoes preciosas e tao particulares, confidenciadas e cumplices tanto de lagrimas quanto de risos.

    Os paralelos que voce traça em relação as cicatrizes (´nos corpos e nas almas´) me deixam convencido de que estou trilhando um caminho que, se nao deixar um legado mundialmente reconhecido, ao menos deixará um registro ainda mais valioso, que é esse resgate individual, interno e oriundo do âmago de cada ser humano, com a exteriorização de sua infancia, com sua memória, com a construcao do seu ser.

    Lindo ver como esses adoraveis objetos podem ser tao confidentes e tao proximos, capazes de conferirem luzes com cores mais carregadas para seu Natal. Lindo saber como eles podem ter intermediado algumas relacoes com sua familia, com amigos, consigo mesmo e com o mundo.

    Um mundo que, se infelizmente mostra-se mais fechado, mais egoista, mais voltado ao consumismo inconsequente, de relações e produtos descartáveis, mais duro e cruel com os sonhadores, por outro ainda permite, nessas datas e nos atos diários destes mesmos sonhadores, um resgate de valores, dignidade e bondade, que ainda são maioria, mas insistem em se manterem calados perante tanta ruindade.

    Você é uma das vozes que trazem o bem para a luz do dia.
    Muito obrigado, Catherine!

    • Responder
      Catherine Beltrão says:

      Eduardo, nunca imaginei, ao escrever este post sobre alguns de meus objetos de estimação de longa data – “os artefatos do afeto”, como você diz – que pudesse estar penetrando de tal forma em seu projeto de vida. Fico extremamente comovida com isso e também fico pensando na responsabilidade que temos em publicar textos em blogs e afins. Nunca se sabe até que ponto podemos tocar o coração e o sentimento das pessoas.
      Mas, neste caso, o que quero com o blog ArtenaRede é exatamente isto: que provoque emoções, que toque o sentimento, que penetre no que temos de mais verdadeiro: a pureza de nós mesmos, enquanto crianças ou não.
      Muito obrigada pelas palavras e sentimento, escritas na tela e existente no coração.

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